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Portugal

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BNP adquire exemplar do mais antigo mapa de Portugal (1561)


cc-950-v_thumbQuando D. Sebastião foi aclamado rei (1557), preparou-se uma embaixada a Roma, para tratar de importantes assuntos de Estado. O embaixador escolhido foi Lourenço Pires de Távora (1510-1573), que chegou a Roma em Junho de 1559.

Em Roma residia um dos mais famosos humanistas portugueses, Aquiles Estaço (1524-1581), notável latinista que redigiu a oração de obediência de D. Sebastião ao Papa e a leu perante Pio IV. Guido Sforza, cardeal protector de Portugal, terá então recebido de Estaço um particular presente: um mapa de Portugal, preparado por Fernando Álvares Seco (fl. 1560), cartógrafo de quem pouco ou nada se sabe.

Do mapa manuscrito original não se conhece o paradeiro, mas, a partir dele, Sebastiano di Re gravou e Michele Tramezzino, conhecido editor veneziano, preparou uma versão reduzida, na escala de ca. 1: 1.340.000, impressa em Veneza mas difundida em Roma, com privilégio do Papa e do Senado de Veneza, datada de 20 de Maio de 1561.


Em 1565, Gerard de Jode, famoso cartógrafo e editor, provavelmente com base no original ou sua cópia, com simplificações e lapsos em relação à imagem de 1561, publicou em Antuérpia uma outra versão de maior escala, ca. 1: 750.000, em quatro folhas, gravada por Jan van Doetichum  e Lucas van Doetichum, que refere a data de 20 de Maio de 1560. De Jode incluirá o mapa nas edições do seu atlas Speculum Orbis Terrarum de 1578 e 1593. A partir dos exemplares de 1561 e de 1565, Abraham Ortelius coordenou uma nova imagem, próxima da de Tramezzino, que conhecerá fama internacional, como folha do atlas Theatrum Orbis Terrarum, com sucessivas edições desde 1570, e Baptista van Doetecum regravará a imagem para o grande atlas de Gerard Mercator, de 1600.

Embora a primeira imagem cartográfica que representa Portugal isoladamente e no seu conjunto seja a de Álvares Seco, pouca atenção tem sido dada ao documento. Constituem excepção os diversos estudos que Suzanne Daveau tem dedicado à obra.

O que mais surpreende o leitor do mapa é a sua orientação, com o Oeste no topo. Observada de Leste (Roma), em perspectiva, a fachada ocidental da península, “perde-se” no horizonte, para Oeste. Sendo uma construção erudita, é natural que a sua orientação represente Portugal como “cabeça” da Europa. Na realidade, o mapa de Álvares Seco é a figuração de um Portugal denominado “Lusitânia”, província da Hispânia romana: “Guido Sforza: dedicamos-te, devido à protecção dispensada à nossa gente, a Lusitânia descrita pela arte de Fernando Alvares Seco…” – diz Estaço na dedicatória ao Cardeal Sforza. Gerard de Jode, na edição de Antuérpia, criará um título: “Portugal outrora a Lusitânia”.

Observando o conjunto da imagem, são dois os principais fenómenos figurados: o povoamento e a rede hidrográfica. O primeiro, contando muitas centenas de topónimos, entre cidades, vilas e aldeias, é mais denso no Portugal atlântico e menos coeso no Portugal mediterrânico. É dado particular destaque às sedes episcopais e aos seus limites, mesmo as mais recentemente criadas, e sobre o mapa inscrevem-se as cinco comarcas e o reino do Algarve. Dois pormenores foram introduzidos, que delatam o autor, como acontecia muitas vezes nas telas de mestres pintores: a “Quinta dos Secos”, perto de Tomar, e a “Quinta Távora”, morgadio da família do embaixador, na península de Setúbal.

Se parece ser o fim da mancha de povoamento que constitui a marcação da linha de fronteira, não é apenas aquela, mas também a rede hidrográfica, que constitui o segundo grande tema do mapa. Com excepção do Minho, do Tejo e do Guadiana, que se prolongam um pouco para o interior da Península, todos os outros rios parecem nascer em Portugal. A própria configuração dos cursos de água adopta muitas vezes um desenho fechado nas cabeceiras, de modo a dar uma ideia de isolamento, de ruptura em relação ao interior da Península, onde o espaço deixado em branco simula um vasto deserto. Portugal é um conjunto de bacias hidrográficas, que correm para o Mar Oceano, bacias fechadas para o interior, em semicírculos que se justapõem ao longo da faixa fronteiriça.

A unidade do país que assim se representa é sublinhada pelas armas da Galiza, do Reino de Leão e do Reino da Andaluzia, que circundam Portugal, uno e coeso sob o escudo dos castelos e das quinas. Na variante de 1565, as armas de Portugal inscrevem-se no escudo empunhado por Neptuno, que cavalga um monstro marinho e proclama a glória das conquistas portuguesas no mar, versão iconográfica do texto da dedicatória a Sforza.

Conhecem-se cerca de duas dezenas de exemplares do mapa de 1561 e apenas um deles se encontra em Portugal, na colecção do Professor Nabais Conde, na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra. Decidiu recentemente a Biblioteca Nacional de Portugal adquirir em leilão um exemplar do mapa de 1561, até agora desconhecido, muito provavelmente antes inserto num atlas da denominada “Escola de Lafreri”. Muitos dos exemplares conhecidos apresentam, como este, o vinco da dobragem, ou encontram-se mesmo incluídos nos atlas.

O gravador e editor francês Antoine Lafréry, referido como Antonio Lafreri (1512-1577), estabelecido em Roma, era então famoso pelo comércio dos seus atlas factícios, colecções de mapas de diversos autores, de diferentes escalas e dimensões. A uniformidade dos volumes era obtida aumentando as margens das imagens mais pequenas e aparando ou dobrando as maiores. É o caso do mapa ora adquirido. Nele existem lamentáveis amputações nas margens esquerda e direita do mapa, se comparadas com as dimensões dos exemplares conhecidos, que se poderão explicar por um excessivo corte em conjunto das folhas de um atlas, aparado e reencadernado. Embora truncada, a imagem agora integrada na Área de Cartografia da Biblioteca Nacional de Portugal, o primeiro mapa de Portugal conhecido, é um notável tesouro cartográfico a juntar à colecção existente.

 
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